O depoimento que marca uma virada de estratégia
O ex-presidente Jair Bolsonaro compareceu ao Supremo Tribunal Federal (STF) na última terça-feira (10) para prestar depoimento no inquérito que investiga uma suposta tentativa de golpe de Estado. O tom adotado por Bolsonaro foi bem diferente do que o público acostumou a ver durante sua gestão na Presidência: nada de críticas ao Supremo, ataques a ministros ou provocações ideológicas.
Pelo contrário. Bolsonaro apresentou uma postura moderada, quase conciliadora, em um movimento que foi interpretado por aliados e analistas políticos como uma tentativa clara de reduzir os danos jurídicos e políticos que o cercam. Ele negou participação em articulações golpistas, afirmou que aceitou a derrota para Lula e até pediu desculpas ao ministro Alexandre de Moraes por declarações passadas.
Estratégia muda: conter danos e evitar confronto
O depoimento representa uma virada estratégica. Bolsonaro e seus advogados abandonaram a postura confrontativa que marcou os anos de governo e adotaram uma narrativa mais moderada, com foco em demonstrar cooperação com o Judiciário. O objetivo agora é minimizar os impactos de uma possível condenação e abrir caminho para um pedido de prisão domiciliar, caso as punições avancem.
Aliados próximos avaliam nos bastidores que o destino jurídico do ex-presidente já está praticamente selado. Como resumiu uma fonte: “entrou condenado, saiu condenado”. A expectativa entre aliados não é mais de absolvição, mas de negociar os termos da punição.
O foco agora é a delação de Mauro Cid
Tentativa de desqualificar as acusações
Outro movimento que se destaca é o esforço das defesas em questionar a credibilidade da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid. Nos depoimentos de outros investigados, como o general Braga Netto, foi perceptível a tentativa de minar a confiança da Justiça na versão apresentada por Cid.
A estratégia parece ser a de plantar dúvidas sobre pontos-chave da colaboração, como a história da “sacola de vinho com dinheiro” supostamente repassada a manifestantes. Esses depoimentos vêm sendo usados como munição para construir a tese de que a delação de Mauro Cid está cheia de lacunas, omissões e contradições.
Braga Netto desafia narrativa
No caso de Braga Netto, ele foi categórico ao rejeitar a versão de que tenha recebido valores para repassar a apoiadores. A versão de Mauro Cid aponta que os recursos seriam usados para manter acampamentos bolsonaristas em frente a quartéis, o que o general nega veementemente.
Para os advogados de defesa, essa linha de atuação é fundamental para desacreditar o principal delator do caso e tentar suavizar as possíveis penas de Bolsonaro e outros investigados.
Depoimento de Bolsonaro: principais pontos
“Tive que engolir a derrota”
Durante o interrogatório, Bolsonaro negou qualquer envolvimento com atos golpistas e afirmou que “teve que entubar” a derrota nas eleições de 2022. Segundo ele, não havia clima político ou apoio popular suficiente para bancar uma ruptura institucional.
Disse ainda que as reuniões com comandantes das Forças Armadas tinham como objetivo discutir alternativas institucionais dentro da Constituição, e não articular um golpe militar.
“Minuta do golpe” foi “exibida rapidamente”
Questionado sobre a chamada “minuta do golpe”, Bolsonaro afirmou que teve contato superficial com o documento. Segundo ele, a minuta foi exibida brevemente em uma televisão durante uma reunião e ele não participou de sua redação, nem sugeriu alterações.
Essa versão, no entanto, entra em choque direto com a narrativa de Mauro Cid, que diz que o ex-presidente interferiu diretamente no conteúdo do texto. Essa contradição é um dos pontos mais sensíveis da investigação e deve pesar no relatório final da Polícia Federal.
Desculpas a Moraes e críticas aos radicais
Em um dos momentos mais emblemáticos do depoimento, Bolsonaro se desculpou com o ministro Alexandre de Moraes por declarações feitas durante o mandato. O gesto foi interpretado como parte do novo tom adotado: menos confronto, mais pragmatismo.
Ele também chamou de “malucos” os apoiadores que pediam AI-5 e intervenção militar. Afirmou ainda que gravou uma live pedindo paz antes de viajar para os Estados Unidos e negou qualquer envolvimento com os ataques do dia 8 de janeiro.
Nova postura para negociar penas
Prisão domiciliar é o cenário mais provável
Nos bastidores, a equipe jurídica de Bolsonaro já trabalha com a possibilidade de condenação em algum grau. A grande questão, neste momento, não é mais se haverá condenação, mas como ela será aplicada. O foco passou a ser o formato da eventual pena: uma das hipóteses em discussão é a prisão domiciliar, possivelmente com uso de tornozeleira eletrônica.
Essa estratégia envolve demonstrar que Bolsonaro não oferece risco de fuga, que está colaborando com a Justiça e que não representa ameaça à ordem pública.
Tática parecida foi usada em outros casos
Vale lembrar que vários políticos já adotaram estratégias semelhantes, como o ex-governador Sérgio Cabral, que passou a colaborar com a Justiça em troca de progressão de pena. No caso de Bolsonaro, essa colaboração não virá via delação, mas por meio de uma postura cooperativa, de baixo risco e sem ataques ao sistema.
Essa abordagem não garante imunidade, mas pode suavizar a resposta da Justiça.
Contexto político e jurídico
Julgamento no STF é peça-chave
O depoimento ao STF é apenas uma parte do processo, mas simboliza uma nova fase do caso. A partir daqui, o foco estará nos relatórios da Polícia Federal, no parecer do Ministério Público Federal e na análise do próprio ministro Moraes, que deve consolidar as provas e encaminhar o julgamento.
O caso é complexo e envolve outros nomes do alto escalão do antigo governo. Portanto, os desdobramentos podem atingir diversas figuras influentes da política e das Forças Armadas.
Efeito colateral: fortalecimento da narrativa de Lula
Politicamente, o caso também reforça a narrativa adotada pelo governo Lula de que a democracia venceu uma tentativa de ruptura. A fragilidade da linha de defesa de Bolsonaro pode acabar servindo como combustível para revalidar o discurso de defesa das instituições, muito usado por aliados do presidente atual.
Conclusão: contenção de danos no radar
A postura adotada por Jair Bolsonaro durante o depoimento ao STF revela um cenário de encurralamento jurídico e estratégia de sobrevivência política. Diante de provas robustas e da pressão crescente, o ex-presidente e sua equipe demonstram foco total na tentativa de reduzir o impacto da possível condenação.
Com uma narrativa de “cooperação com a Justiça” e o esforço para desacreditar a delação de Mauro Cid, Bolsonaro tenta ganhar fôlego enquanto se aproxima o julgamento que pode definir seu futuro político e pessoal.
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